terça-feira, 23 de agosto de 2011

Crianças de São Paulo

Fui surpreendida com a notícia de crianças que destruíram um restaurante em São Paulo. Apenas um deles tinha 12 anos, os demais todos com menos idade que isso.
Há uma pergunta que não cala em mim. O que faz crianças serem consideradas perigosas a tal ponto que ninguém as consegue conter? Não há nada no Estatuto da Criança e do Adolescente que afirme que crianças não possam ser seguradas pelo braço a fim de que não se machuquem e que eventualmente não machuquem as pessoas.
Não se trata de violência nesse caso, mas de contenção com intuito de impedir algo dessa natureza. Não estava lá, mas imagino que houvessem adultos que tem naturalmente mais força física que uma criança. Só consigo atribuir ao desconhecimento da lei e ao medo coletivo instalado e subliminar que paralisa as pessoas e judiciariza tudo.
Ou transforma atos como esses em casos meramente policiais. É muito maior que isso. É muito mais que isso. Essa cena tem facetas múltiplas.
O que leva crianças tão pequenas a prática de tamanha barbaridade? Elas deveriam estar protegidas, cuidadas e não barbarizando pelas ruas. Crianças tem prioridade absoluta em todas as políticas públicas a fim de que sejam protegidas. Crianças necessitam de atenção integral. Em caso de não estarem vivendo em condições dignas necessitam ser acolhidas em instituições que promoverão ,juntamente com outros agentes do sistema de garantia de direitos, a sua proteção. Afinal de contas, crianças são o futuro da nação.
Esse chavão me acompanha desde  minha infância que já está  longe em cronologia. Depois o que leva cidadãos brasileiros a temerem em desespero crianças enlouquecidas? A ação coletiva é a paralisia.
Chama - se a polícia.
Ninguém mais deve agir. O coração não bate mais, seria isso? Os impulsos para casos assim estão fora de padrão? Repito que não estava lá, mas me custa crer que crianças franzinas sejam capazes de "tocar o terror" e depredar um restaurante inteiro e depois a delegacia de polícia. A delegacia de polícia também?
Uma idéia me persegue nessas horas. É a quase certeza do desconhecimento da lei. O Estatuto da Criança e do Adolescente é alvo de críticas apesar dos seus 20 anos de existência. Ao lê - lo observamos que o mesmo possui uma linguagem simples e artigos de fácil compreensão. A moral da história ECA é: crianças e adolescentes devem poder crescer em condições dignas a fim de que se tornem cidadãos dignos. Nada mais que isso. Portanto, bater é um ato de violência. Desse modo, não é possível em situações como essa, sair dando cadeirada e vassourada. Mas nada impede que um adulto contenha fisicamente uma criança.
Se tivermos medo de crianças o que será de nós e delas num futuro próximo? O que se imagina? Que elas fiquem presas? Não, não serão presas porque não respondem por seus atos nessa idade. 
Me vem uma outra pergunta: qual o tamanho da violência a qual são submetidas essas crianças para que tenham respostas tão violentas? Quem serão seus pais? Em que condições vivem? Como se alimentam? Qual o carinho e respeito que conhecem? Quais políticas públicas as assistem e estimulam? Quais seus potenciais estão sendo ressaltados e valorizados? 
Não é um problema de polícia somente. É um problema de família, sociedade e Estado. É uma outra lei , a Constituição Federal Brasileira em seu artigo 227 que muitos não leem. Fácil achar que fazer a sua parte é pagar contas, pagar imposto e afins. Nesse artigo está dito que o papel de cuidar com absoluta prioridade de crianças e adolescentes é papel coletivo. Cidadãos não estarão "se metendo" na vida dos outros ao agirem em situações dessa ordem. Estarão exercitando cidadania. 
O tal do fazer a "minha parte" acaba com muitas responsabilidades coletivas. Se cada um imaginar uma idiotice como sendo "sua parte", continuaremos construindo uma sociedade imbecilizada pela ignorância e pelo medo. Fazer a sua parte, a nossa parte é muito mais que ir na urna e votar em qualquer amiguinho com tendências a ser pavão ou muito "vaidoso", ou votar em racalcados que imaginam através do poder nefasto da política exercida por muitos deles remontar seus egos adoecidos. Fazer sua parte é pensar e agir. Pedir nas ruas, nas redes sociais, nas mídias, nas rodas de amigos, nos grandes coletivos mais justiça social e menos desigualdade talvez seja algo importante a ser feito.
Exercitar a compaixão por pessoas como essas crianças que com tão pouca idade já tenham conhecido tamanha violência e desumanidade a tal ponto de sentirem - se capazes de reproduzir atos dessa natureza, quem sabe seja parte de nossa parte. É muito caótico temer as crianças e desejar a redução da maioridade penal ( que diga - se de passagem é inconstitucional), é simplificar nosso medo. É antagônico demais que 90% das pessoas tenham como sonho número um da fase adulta, ter filhos e temer crianças da maneira como acontece quando ocorrem atos como esse. Elas são só crianças, reflexo dos adultos, instruídas por nós e representantes do futuro! Não posso deixar de mandar um abraço enorme ao Renato Russo que deve se revirar na tumba todas as noites, incrédulo do quanto suas músicas ainda são tão relevantes. "Que País é Esse?" "Ninguém respeita a constituição, mas todos acreditam no futuro da nação"...

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